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EFEITOS DAS SECAS SERTANEJAS: Castigo divino ou inércia humana? | Por Enaldo Brito e Zé Aldo Rabelo

A luta contra a natureza sempre será desigual para o homem, mas ela (a natureza) sempre dará pistas para que o homem descubra o melhor caminho.

A natureza é sábia, e tem, ao longo dos anos, revelado essa sua virtude.

O Planeta terra é cheio de diversidades climáticas, por isso mostra-nos vocações variadas nas muitas regiões do Globo. Temos pontos da terra em que pessoas vivem em situações extremas e totalmente díspares umas em relação às outras, tal como, das geleiras dos polos, às altas temperaturas dos desertos, onde se experimentam os ápices do frio e do calor.

Mas nem por isso esses pontos extremos são desprovidos da sapiência da natureza, que mantém riquezas e potencialidades suficientes para prover homens e animais que nesses lugares habitam.

O mesmo ocorre em relação ao semiárido nordestino, que, frequentemente, sofre pelos vorazes efeitos de longas estiagens que insistem em nos visitar com regularidade.


A SECA, portanto, é um fenômeno natural, e cíclico, no qual não há como o homem interferir para evitá-la, pois a sua ocorrência, pelo menos por ora, independe da ação humana.

Todavia, embora não havendo ação eficiente para evitar a seca, há um sem número de possibilidades e iniciativas com vistas a garantir que seus efeitos não sejam sentidos na mesma magnitude do que vem ocorrendo por séculos.

O semiárido nordestino revela dois tipos de pobreza: a pobreza de fato e a pobreza aparente.

A pobreza de fato é esta a que todos assistimos, cortando na carne e no osso de cada irmão, em cada cabeça de gado caindo desfalecida sobre o chão rachado, na ausência do poder público e no oportunismo de exploradores que seguem uma linha hereditária perversa. 

A pobreza aparente repousa na maneira afobada de como tiramos conclusões a respeito do ambiente natural que nos cerca, crendo precocemente naquilo os olhos veem.

Mas é preciso que olhemos o nosso ambiente com mais critério, com senso de investigação e curiosidade, de modo a não considerarmos somente a existência daquilo que se nos apresenta como evidente, buscando tomar conhecimento do que há por trás, encoberto, implícito, ocultado pela carapaça que o cobre.

Em se observando com mais critério, descobriremos que há um mundo de riquezas intactas no semiárido.

É preciso alentarmos que dificuldades análogas são enfrentadas por quem vive sob frio extremo. Ou devemos achar que a natureza sorri mais bondosamente para os povos das terras frias?

Não! Não mesmo! Muitas vezes, especialmente no rigor da estação gelada, muitos lamentam por não ter o clima dos trópicos tão perto deles. Pois lá, do mesmo modo que a água abunda, o sol escasseia, e aí ficamos nós, com o sol daqui, e eles, com a água de lá, mas, em ambos os pontos, cada um ansiando o elemento vital que predomina no clima um do outro.

As histórias de secas no sertão nordestino são muitas, e vêm de longa data. 

Área do Polígono das secas: Almanaque Abril
Por ser um fenômeno cíclico, há estudos que apontam uma SECA rigorosa a cada período de 26 anos, podendo variar para mais ou para menos, mas sempre em torno deste período.

No intercalar de cada 26 anos, porém, também por características naturais, podem surgir períodos de estios longos, mas que não se lhes atribuem como SECAS propriamente ditas.

O fenômeno SECA sempre bateu à porta do sertanejo nordestino, especialmente na região conhecida como Polígono das Secas, que permeia 8 (oito) estados nordestinos - ficando de fora o estado do Maranhão -, e o norte do estado de Minas Gerais, o Grande Sertão Veredas, tão bem ilustrado na célebre literatura de João Guimarães Rosa.

Apesar de a nossa região ser chamada de Polígono das Secas, há, pelo mundo afora, lugares bem menos chuvosos que o nosso, com a diferença de os efeitos das estiagens serem devidamente, e previamente, remediados, tal como no deserto Neguev, em Israel, e no estado da Califórnia, nos Estados Unidos. 

Irrigação por gotejamento em Israel
A fim de que tenhamos uma dimensão do descaso que sofremos, no nosso Polígono chove uma média de 400 a 700 milímetros por ano, enquanto na Califórnia e Israel a média não passa de 100 milímetros, fazendo com que recebamos da natureza até sete vezes mais água. O contraditório, entretanto, é que a Califórnia é uma das regiões de agricultura mais desenvolvida no mundo. Em Israel, onde cerca de 60% do seu território é desértico, se desenvolve a agricultura mais moderna, onde, no Deserto Neguev, se iniciou a irrigação por gotejamento. Lá, em Israel, também se desenvolveu um dos mais eficientes métodos de transposição de águas, como a bem sucedida transposição do Mar da Galileia, enquanto que, aqui, no sertão nordestino, praticamos uma agricultura medieval, beirando à que se praticava na Era Paleolítica.

Por que motivo é que no Nordeste Brasileiro nunca se superou este obstáculo?

Afinal de contas, somos privilegiados por grandes volumes de água sob os nossos pés, como o Poço Violeta, no Vale do Rio Gurgueia, no Piauí, maior vazão da América Latina, com um jorro 800.000 litros d’água por hora, e, no tocante ao Sertão Baiano, o Aquífero Tucano, onde também a vazão é ultragenerosa. 

Grota do Angico
No Nordeste, tem sido tão notório o abandono imposto ao sertanejo, que mesmo em lugares próximos a grandes reservatórios de água a pobreza consegue imperar. A Cidade de Poço Redondo, município onde fica a Grota do Angico, onde Lampião e seu bando tiveram seu fim, em Sergipe, é um exemplo de abandono, visto que se localiza a cerca 20 km do Rio São Francisco, e, nem com esse privilégio, tem conseguido atenuar os efeitos das secas, sendo um dos municípios que mais sofrem com as estiagens no estado. Do outro lado do Velho Chico, em Alagoas, cidades como Piranhas e Delmiro Gouveia ainda passam sede, mesmo com um vizinho tão caudaloso em águas.

Há, no estado de Sergipe, um projeto do governo do estado – PROJETO CALIFÓRNIA - que se arrasta há mais de vinte anos, com vistas a debelar o mau que assola o município de Poço Redondo e cidades vizinhas, como Carira, Nossa Senhora da Glória, Porto da Folha, e tantas outras, cuja execução nunca saiu do discurso. 

A maior SECA de que se tem notícia até hoje, pelo menos a que mais vitimou pessoas, ocorreu no quadriênio de 1877 a 1880. À época, a população nordestina era de cerca de 5 milhões de habitantes, e, durante o longo estio, houve uma redução de 10% do contingente populacional, quando a voracidade da SECA ceifou a vida de mais de 500 mil pessoas, isso tudo sem considerar prejuízos noutras órbitas de vida do sertanejo. Tamanha foi a catástrofe, que o próprio Imperador Pedro II bradou que venderia até a última joia da Coroa para acabar com a SECA. Resultado: as joias da Coroa não foram vendidas nem empenhadas, e a SECA continua a assombrar o nordestino.


O desinteresse dos nossos representantes políticos, somado ao comodismo e falta de informação da grande massa humana que somos, torna distante a solução para debelar este grande mal que nos assola frequentemente, parecendo impossível, por assim dizer.

Portanto, inegavelmente, o SERTÃO apresenta um sem-número de possibilidades, pelo que tomamos como exemplo a grande fruticultura instalada às margens da Barragem de Sobradinho, onde foram desenvolvidos estudos e plantios de diversas espécies de frutas, com destaque para a antes impensada cultura da uva, de onde já se extraem os melhores vinhos do Brasil, superando, inclusive, os pioneiros da cultura no País, o estado do Rio Grande do Sul. Segundo se comenta, a vantagem do Sertão em relação às terras frias está justamente na possibilidade de o homem cuidar melhor da irrigação sobre o plantio, molhando-o em intervalos que lhe beneficiem melhor, sem o risco das grandes geadas que comprometem plantações inteiras, sem contar que o sol também se apresenta como aliado no desenvolvimento da clorofila das plantas, tornando-as mais viçosas, de frutos mais doces, apetitosos e saudáveis.

É importante que não desistamos com o aparecimento dos primeiros obstáculos, pois possibilidades para superá-los é o que não faltam, bastando, somente, que sejamos observadores e criteriosos, e, com coragem de trabalhar, os transporemos e gozaremos depois do resultado positivo e surpreendente que virá.

Observação, critério, paciência, obstinação e trabalho: são estes os elementos substantivos de que tanto precisamos para provarmos que o nosso Sertão é prenhe em recursos.


Saudações Sertanejas, sempre!!

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